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Cuidados essenciais na cláusula de arbitragem

cuidados essenciais na cláusula de arbitragem

 

A arbitragem, regulamentada pela Lei 9.307/1996, vem ganhando espaço cada vez maior nos contratos entre empresas. No entanto, muitos contratos não observam certos cuidados essenciais na elaboração da cláusula de arbitragem. Isto acaba refletindo posteriormente no momento de instauração do procedimento arbitral, causando demora para o início da arbitragem e, em certos casos até mesmo a anulação da cláusula de arbitragem.

 

Como utilizar a arbitragem?

Para resolver um conflito por meio de arbitragem as partes podem adotar basicamente dois caminhos: acionando a cláusula compromissória prevista no contrato, ou firmando um compromisso arbitral, nos casos em que o contrato não contenha uma cláusula de arbitragem. Isto significa dizer que mesmo nos contratos que não tenham cláusula de arbitragem as partes poderão, de livre e espontânea vontade, submeter o conflito a arbitragem firmando um compromisso arbitral, conforme prevê o art. 9º da Lei de Arbitragem.

Quando existe no contrato uma cláusula de arbitragem, esta se torna obrigatória para as partes e isto facilitará muito o início da arbitragem no momento em que o conflito ocorrer. Já nos casos em que as partes não estabeleceram uma cláusula de arbitragem no contrato, a utilização do compromisso arbitral pode se tornar mais difícil, uma vez que uma das partes pode não concordar em submeter o litígio à arbitragem. Nesse caso, não havendo concordância de ambas as partes para a submissão do conflito à arbitragem, a única forma de solução do litígio será a via  judicial.

Por isso é muito importante que as partes estabeleçam por escrito no contrato ou em documento apartado a cláusula de arbitragem, pois somente assim qualquer delas poderá fazer valer efetivamente a arbitragem como meio de solução dos conflitos contratuais. Mas além disso, é importante adotar certos cuidados essenciais na elaboração da cláusula de arbitragem, para que ela funcione efetivamente se for necessário utilizar a arbitragem.

 

Os dois tipos de cláusula compromissória

Há basicamente dois tipos de cláusulas de arbitragem: a cheia e a vazia.

A cláusula compromissória cheia é aquela em que as partes estabelecem as regras de como será iniciada e processada a arbitragem. Esta cláusula deve indicar, pelo menos, como deve ser feita a notificação para o início da arbitragem e as regras para o processamento da arbitragem. Geralmente, as cláusulas cheias definem qual o órgão arbitral institucional será responsável para administração da arbitragem (geralmente um Câmara de Arbitragem ou entidade especializada). Nesse caso, as regras para a instauração e o processamento da arbitragem são definidas nos regulamentos de arbitragem e nos regimentos internos das Câmaras de Arbitragem, o que facilita muito a tramitação do processo. Se uma das partes não quiser dar início à arbitragem, a outra poderá fazê-lo e a arbitragem correrá normalmente.

A cláusula compromissória vazia é aquela em que as partes simplesmente indicam que os conflitos serão resolvidos por meio de arbitragem, mas não estabelecem como será iniciada a arbitragem e tampouco qual órgão arbitral irá administrar a arbitragem. Nesse caso, não há normas predefinidas para se dar início à arbitragem e isso pode dificultar bastante o início da solução do conflito. Quando o contrato prevê a cláusula vazia e uma das partes não atende ao pedido de início da arbitragem, será necessário o ajuizamento de uma ação judicial na qual o Juiz irá definir o compromisso arbitral que disciplinará o processamento da arbitragem, geralmente definindo as regras de uma Câmara de Arbitragem para tanto.

 

As vantagens da cláusula de arbitragem cheia

Como visto acima, a cláusula vazia pode gerar dificuldades para a rápida instauração da arbitragem. Isto porque, caso uma das partes se negue a inciar a arbitragem firmando o compromisso ou o termo de arbitragem, a outra parte terá que ajuizar uma ação para que o Juiz fixe as regras da arbitragem.

Segundo o relatório Justiça em Números 2019 do Conselho Nacional de Justiça, uma ação na primeira instância da justiça estadual dura em média três anos e três meses. Se houver recurso, na segunda instância dura em média mais um ano e um mês, totalizando cerca de quatro anos e quatro meses. Ou seja, no caso de uma cláusula compromissória vazia, é possível que as partes tenham que aguardar em média mais de quatro anos apenas para a definição do início da arbitragem. Trata-se de uma longa espera, sem que o conflito seja resolvido. O tempo judicial é muitas vezes incompatível com o tempo empresarial, onde a solução dos litígios precisar ser rápida e eficaz para que as empresas prossigam suas atividades em segurança.

Por isso, é de suma importância que ao elaboraram a cláusula compromissória as partes adotem utilizem a cláusula de arbitragem cheia, que se torna obrigatória mesmo que um dos contratantes não queira dar início à arbitragem, evitando assim a necessidade de judicializar a instauração da arbitragem. Além disso, há alguns cuidados essenciais na elaboração da cláusula de arbitragem, que será apresentados logo abaixo.

 

Cuidados essenciais na elaboração da cláusula de arbitragem

Conforme vimos no tópico anterior é sempre aconselhável utilizar a cláusula cheia, já que a cláusula vazia pode trazer grande demora para o início da arbitragem, dificultando a rápida e eficiente solução do conflito.

A Lei de Arbitragem determina que a cláusula cheia contenha pelo menos as regras para a instauração e processamento da arbitragem. Em geral, para evitar a criação de cláusulas compromissórias muito longas e minuciosas, as partes costumam indicar uma Câmara de Arbitragem para administrar a instauração e o  processamento da arbitragem.

Muito embora não sejam obrigatórios, é importante que as partes prevejam alguns cuidados essenciais na elaboração da cláusula de arbitragem. Isto dará com maior clareza e previsibilidade de como será instaurada a arbitragem e quais regras os árbitros deverão utilizar para processar e julgar a controvérsia.

 

Definição da Câmara de Arbitragem

O primeiro cuidado que as partes devem ter é a indicação da Câmara ou órgão que será o responsável pela administração do processo arbitral. Atualmente existem no país diversas Câmaras de Arbitragem muito bem organizadas, com regulamentos e regimentos bem elaborados  e que têm bastante experiência e credibilidade para a boa condução da arbitragem. As partes devem examinar os regulamentos e demais  normas da Câmara que pretendem indicar na cláusula cheia, de modo que saibam de antemão as regras que serão utilizadas na condução do processo. Importante não confundir a Câmara de Arbitragem, responsável apenas pela administração da arbitragem, com os árbitros, que são responsáveis pelo julgamento do caso.

 

Árbitro único ou Tribunal Arbitral?

Um segundo cuidado que deve ser adotado é a definição de como será julgado o conflito. As partes podem definir que o caso será julgado por  um árbitro único ou por um Tribunal Arbitral. O árbitro único pode ser nomeado mediante concordância das partes ou por indicação da Câmara, caso as partes não cheguem a um consenso na definição do árbitro. Já o Tribunal Arbitral geralmente é composto por pelo menos três árbitros, sendo um indicado por uma  parte, outro por  outra parte e o terceiro, que geralmente será o  presidente do Tribunal nomeado pela Câmara de Arbitragem de acordo com as regras do seu regulamento e do regimento interno.

Há vantagens e desvantagens em cada modelo. No caso de árbitro único, os custos  envolvidos com o processo arbitral geralmente são menores, já que as partes arcarão com os honorários de apenas um julgador. No entanto, o árbitro único irá decidir sozinho a controvérsia, segundo o seu juízo do caso. Isto gera uma grande concentração de poder nas mãos do julgador, especialmente porque em geral não existe recurso de segunda instância contra a decisão da arbitragem.

Por outro lado, o Tribunal Arbitral tende a desconcentrar poder, já que cada árbitro terá direito a um voto para formar a decisão do caso, tal como ocorre normalmente nos Tribunais do Poder Judiciário. Além disso, em geral três cabeças pensam melhor do que uma só. No entanto, os custos com a arbitragem tendem a subir, pois em veze de um honorário as partes terão de arcar com os honorários dos três árbitros, multiplicando por três vezes, pelo menos, este custo.

Para controvérsias mais simples ou de reduzido valor, a definição de árbitro único geralmente é uma boa opção. Já para os  litígios mais complexos, que envolvem mais de uma área de conhecimento ou em que são discutidos valores mais significativos é mais aconselhável que a causa seja analisada por um Tribunal Arbitral.

 

Arbitragem de direito ou de equidade?

O terceiro cuidado  que as partes devem ter na redação da cláusula de arbitragem é definir se o julgamento da controvérsia será por aplicação de regras de direito ou por juízo de equidade, conforme prevê o art. 2º da Lei 9.307/1996. Na arbitragem de direito, o árbitro ou o Tribunal Arbitral irá julgar o caso de acordo com as leis e regras de direito, tal como o faria um juiz. Na arbitragem de equidade, o árbitro ou Tribunal julgará o caso de acordo com o princípio da equidade, segundo a sua ideia de justiça, sem ter que fundamentar a decisão em regras específicas de direito.

Em geral, a maior parte das arbitragens nacionais são de direito, já nos casos de arbitragem internacional a equidade é mais frequente, uma vez que muitas vezes não existem normas de direito internacional que possam bem endereçar a solução do conflito. De qualquer modo, a arbitragem de direito em geral é mais segura, porque os árbitros terão que fundamentar a decisão em normas jurídicas e não apenas na equidade e na ideia de justiça sobre o caso, o que muitas vezes pode ser um tanto quanto subjetivo.

Definição da local da arbitragem e da legislação aplicável

O quarto cuidado que se deve ter ao elaborar uma cláusula de arbitragem é a definição do local onde será processada a arbitragem e da legislação aplicável. Em geral, a arbitragem é processada no local da Câmara de Arbitragem responsável pela administração do conflito. Mas isto não é obrigatório. As partes podem definir livremente que o processamento da arbitragem ocorrerá em local diferente da Câmara, em local que torne o processamento menos dispendioso ou mais célere. A definição da legislação aplicável também é relevante nos casos em que uma das partes não esteja sediada no Brasil. Nesses casos, muitas vezes as parte optam pela adoção da legislação estrangeira ou por normas de direito internacional privado, ou, ainda, pela aplicação de usos e costumes comerciais que melhor se amoldem à relação jurídica e econômica entre as partes.

 

Arbitragem em matérias de alta especialização técnica: o papel do árbitro especialista

Por fim, uma última dica é a definição da qualificação dos árbitros. Uma das grandes vantagens da arbitragem é poder escolher um ou mais árbitros especializados no assunto. Os litígios submetidos ao Poder Judiciário raramente são julgados por especialistas no assunto, mas sim por juízes que atuam em áreas mais abrangentes.

Por outro lado, nas arbitragens privadas as partes podem prever, por exemplo, que determinada questão em uma obra de engenharia será  julgada por árbitro com formação em engenharia. Uma questão relativa ao desequilíbrio econômico-financeiro de um contrato poderá ser julgada por árbitro com especialização em administração e gestão contratual. Numa controvérsia envolvendo o mercado financeiro, as partes podem decidir que o árbitro tenha formação específica em finanças. E assim por diante.

A escolha de pelo menos um árbitro especialista agregará muita qualidade na análise do caso, reduzindo incertezas e o risco de decisões que  juridicamente são válidas, mas que materialmente não são boas para as partes. Em outras palavras, o papel do árbitro especialista é justamente agregar conhecimento profundo e qualificado que poderá ser de extrema relevância para uma solução eficiente e eficaz do conflito, maximizando os interesses das partes.

Se a qualificação técnica do árbitro não constar da cláusula compromissória, isso poderá gerar impasses posteriormente quando da indicação do árbitro pelas partes, especialmente nos casos de julgamento por árbitro único. Por isso, se as partes entendem que o conhecimento específico da matéria que permeia a controvérsia é um diferencial importante para o bom julgamento do caso, é ideal que já  indiquem isso na cláusula cheia.

A correta adoção desses cuidados essenciais na elaboração da cláusula de arbitragem permitirá uma rápida e eficaz solução de controvérsias, reduzindo custos e otimizando o tempo das partes. Além disso, a adequada técnica de elaboração da cláusula cheia confere maior segurança jurídica para os contratantes  que saberão, de antemão, como será instaurada e  processada a arbitragem, permitindo assim a melhor avaliação dos riscos e custos envolvidos na solução da controvérsia.

Por Arthur Villamil

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