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Empresas devem definir alocação de riscos em contratos

risco negócio

Liberdade para alocação de riscos

 

Uma das novidades da recente Declaração dos Direitos de Liberdade Econômica (Lei 13.874/2019) é a possibilidade da empresa definir a alocação dos riscos nos contratos civis e empresariais. Isto significa que ao elaborar um contrato as partes podem especificar os riscos que cada contratante deverá suportar. Esta inovação introduzida no art. 421-A do Código Civil é de grande importância porque evita que a interpretação da alocação de riscos (uma tarefa extremamente difícil) seja feita somente no momento do julgamento de um conflito pelo Juiz.

Por isso, a elaboração dos contratos passará a exigir mais atenção das partes e de seus advogados, para que sejam previamente mapeados os riscos relacionados ao cumprimento do contrato e corretamente definida a distribuição dos riscos para cada contratante. A correta alocação dos riscos no próprio contrato poderá evitar muitos conflitos que atualmente acabam se transformando em processos judiciais longos e dispendiosos.

 

Que tipos de riscos devem ser tratados no contrato?

 

Em linhas gerais, risco significa a possibilidade de ocorrência de um evento futuro e incerto que tenha impacto sobre as expectativas da empresa. Em Administração o risco está relacionado à probabilidade de acontecimento de um evento futuro e os impactos causados a empresa caso ele ocorra. Há diversos tipos de riscos que as empresas correm no dia a dia: risco de saúde e segurança, risco ambiental, risco financeiro, risco legal, risco do negócio, risco tecnológico, risco operacional, risco regulatório, risco externo, risco interno, dentre outros.

Do ponto de vista contratual, o risco está relacionado com a probabilidade de acontecimentos futuros e incertos, não causados pelas partes, que possam prejudicar o cumprimento das obrigações contratuais de um ou mais contratantes. Ao assinarem um contrato, as partes devem mapear os principais riscos a que estarão expostas ao longo da execução do contrato e devem definir a alocação dos riscos, ou seja, devem definir quais riscos serão suportados por cada contratante. A correta alocação dos riscos no contrato reduzirá significativamente discussões futuras em caso de descumprimento contratual, por já estarem previamente delimitados os riscos de cada parte.

Assim, os riscos que devem ser definidos pelas partes são os relacionados a acontecimentos que possam impactar de modo negativo o cumprimento do objeto do contrato ou das obrigações das partes. Incluem-se aí todos os fatores externos à vontade das empresas que podem, ainda que remotamente, dificultar a performance da execução do contrato.

Cada contrato deverá ser analisado individualmente e com profundidade, não apenas do ponto de vista meramente legal, mas também sob o prisma da sua viabilidade de execução, de modo que as empresas contratantes possam mapear previamente os riscos a que estão  sujeitas naquela operação, para numa etapa seguinte estabelecer  que riscos cada parte irá assumir.

O mapeamento dos riscos pode ser feito com a utilização de diversos tipos de análises, desde complexos cálculos atuariais e estatísticos até a ferramentas mais  simples como a tradicional análise SWOT. O diálogo entre os advogados, o setor operacional, o setor comercial e financeiro e o setor de gerenciamento de riscos é de fundamental importância para definir alocação de riscos em contratos.

 

Exemplos de riscos comuns em contratos

 

Os riscos mais comuns em contratos podem ser classificados em duas categorias: riscos relacionados à inviabilidade de cumprimento do objeto/finalidade do contrato e riscos relacionados ao descumprimento das obrigações das partes.

No primeiro grupo tem-se todos os motivos relacionados à força maior, caso fortuito, fato da Administração Pública, riscos regulatórios e legais e também risco de inviabilidade prática do cumprimento. Por exemplo, a ocorrência de greve de terceiros (nunca dos próprios contratantes e seus colaboradores) que impeça a entrega de um bem ou equipamento na data contratada. Ou, ainda, a criação de uma nova regulamentação legal para um setor da economia, que inviabilize a atividade, como, por exemplo, a exigência de carteira de habilitação específica para utilização de patinetes. Enchentes, terremotos, incêndios, atos da natureza em geral também devem ser previstos, a fim de que  os danos derivados de sua ocorrência (e não da ocorrência em si) sejam tratados adequadamente no contrato.

No segundo grupo, mais complexo, incluem-se todos os riscos relacionados as vulnerabilidades de cada empresa no que diz respeito ao cumprimento de suas obrigações contratuais específicas. Para um adequado mapeamento desses riscos é preciso conhecer com profundidade da realidade do empreendimento e as dificuldades que podem surgir durante a execução do contrato. Por exemplo, em contratos de construção e outras obras de engenharia, devem ser alocados os riscos de falhas ou incompletude de projetos (básico e executivos), riscos relacionados à chuva e suas consequências, bem como riscos de deslocamento de atividades críticas para o período chuvoso, riscos geológicos e do solo, risco de escassez de mão-de-obra, riscos de caixa e crédito, riscos de obtenção de licenças, riscos operacionais e riscos relacionados à solidez e segurança da construção.

 

Uma nova visão para empresas e seus advogados

 

A definição dos riscos de cada contratante já bastante adotada nos Estados Unidos e na Europa, mas ainda é muito pouco utilizada no Brasil. Em parte, isso deve à excessiva intervenção judicial nos contratos, o que desestimulava os contratantes a fazerem a partilha de riscos porque posteriormente uma decisão judicial poderia facilmente desconsiderar a alocação de riscos definida pelas partes. Além disso, os advogados brasileiros estão pouco familiarizados com o mapeamento e alocação expressa de riscos nas minutas de contratos.

No entanto, com a alteração que a Declaração de Direitos de Liberdade Econômica introduziu no art. 421-A do Código Civil, o Poder  Judiciário ficou muito mais limitado na revisão de cláusulas contratuais, já que a alocação de riscos definida pelas partes deve ser respeitada e observada pelo Juiz. Essa inovação, que a princípio parece pequena, terá grandes efeitos sobre os negócios entre empresas e os advogados terão que aprender mais sobre os negócios dos seus clientes de modo a elaborar contratos com a adequada alocação de riscos, já que aquilo que for definido em contrato deverá ser observado e respeitado pelo Juiz.

Com a Declaração de  Direitos de Liberdade Econômica a força obrigatória dos contratos ganha um novo impulso, e as empresas e seus advogados deverão se preparar para entrarmos em uma era de contratos mais complexos, detalhados e precisos, para definir alocação de riscos em contratos.

A consultoria jurídica preventiva ganhará papel de destaque e aqueles modelos padrão de contratos, muitas vezes elaborados por “robôs” jurídicos ou simplesmente copiados de modelos anteriores deixarão muito a desejar, já  que dificilmente contemplarão a correta análise, mapeamento e alocação dos riscos na situação  concreta de cada empresa.

Por outro lado, espera-se que com contratos mais bem elaborados haja substancial queda na  judicialização das relações entre empresas, fato que é poderá contribuir de modo significativo com crescimento econômico e com a geração de prosperidade nas empresas.

Por Arthur Villamil Martins

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