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Risco de aplicação de multas excessivas e frustração da legislação antitruste

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O Conselho Administrativo de Defesa Econômica tem se afirmado com um órgão sério e eficaz no combate a infrações da ordem econômica. Já são notórias as multas milionárias e, em certos casos até bilionárias, aplicadas a empresas brasileiras e estrangeiras, especialmente em casos de formação de cartel. São comuns e frequentes, em processos julgados pelo Cade, a aplicação de multas altíssimas. Apenas a título de exemplo, em 2010 o Cade condenou cinco empresas do ramo dos gases industriais e medicinais ao pagamento de multas de mais de 2,5 bilhões de reais. Em 2014 o Cade condenou empresas do setor de cimento a pagarem mais de 3,1 bilhões de reais em multas por formação de cartel.

O elevado valor das multas assusta, mas a legislação antitruste confere respaldo às penalidades aplicadas. De acordo com o art. 37 da Lei 12.529/2011 o Cade pode aplicar multas que variam de 0,1% até 20% do faturamento bruto obtido pela empresa ou pelo grupo econômico no ano anterior à instauração do processo administrativo. Isso significa, por exemplo, que uma empresa que faturou 10 milhões de reais no exercício social anterior ao ano da instauração do processo pode ser multada em até 2 milhões de reais pelo Cade e, caso seja reincidente, a multa será aplicada em dobro. Além disso, as multas nunca devem ser aplicadas em valores inferiores ao benefício econômico obtido pela empresa com a prática anticompetitiva. Isso significa que a lei autoriza o Cade a aplicar multas sempre superiores a o benefício econômico auferido pelo agente com prática anticompetitiva.

A razão de ser dessas drásticas penalidades é justamente prevenir e desestimular a prática de condutas capazes de lesar a livre concorrência, dentre as quais o cartel é a mais comum e mais grave. Assim, a empresa que prejudica ou que simplesmente expõe a risco a livre concorrência ou a livre iniciativa fica sujeita a multas de valores altíssimos, nunca inferiores ao benefício econômico auferido, de modo a tornar a infração economicamente desinteressante para a empresa. Na seara do Direito da Concorrência, o “crime não compensa”, já que as multas são extremamente pesadas e nunca deverão ser inferiores ao benefício econômico obtido pelo infrator, de modo a efetivamente prevenir, reprimir e desestimular violações da livre concorrência e da livre iniciativa.

Contudo, ao fixar as multas, o Cade deve levar em consideração as principais finalidades da lei, quais sejam proteger a livre iniciativa e a livre concorrência como pressupostos para o bom funcionamento do mercado. Nesse sentido, as multas aplicadas não podem inviabilizar o prosseguimento das atividades da empresa, sob pena de acabarem violando o direito constitucional de livre iniciativa. Se impuser multas que absorvam parcela significativa do patrimônio de uma empresa ou que comprometam o seu regular funcionamento, o Cade estará potencialmente retirando um agente econômico do mercado, reduzindo a competição e a livre concorrência e tolhendo o direito de livre iniciativa do agente econômico. Com isso, em vez de atingir as finalidades da lei antitruste o Cade estará, ao contrário, prejudicando a competitividade e o normal funcionamento do mercado, ao acabar excluindo do mercado os agentes punidos.

É necessário que, ao fixar o valor das multas, o Cade observe não apenas a gravidade da infração como também a capacidade econômica da empresa, de modo a não aplicar multas que possam inviabilizar o prosseguimento das suas atividades, com evidente cerceamento do direito de livre iniciativa e, por conseguinte, diminuição da livre concorrência.

Paradoxalmente, ao aplicar multas muito elevadas, em certos casos até mesmo superiores ao patrimônio líquido de certas empresas (fato que vem ocorrendo desde o ano de 2013 com vários postos de combustíveis multados em milhões de reais por suposta formação de cartel), o Cade, em vez de prestar boa e eficiente tutela da livre concorrência está, ao contrário, eliminando agentes do mercado e, assim, frustrando ou diminuindo a competição, a livre concorrência e a livre iniciativa. Nunca é demais relembrar as seculares lições do Marquês de Beccaria, segundo o qual as penas devem ser lógicas, proporcionais e possíveis de serem cumpridas. Como diz a sabedoria popular: “Remédio demais é veneno”. E, na seara econômica, multas excessivas ou desproporcionais, em vez de protegerem o mercado, acabam, em verdade, por prejudicar o seu bom funcionamento.

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